segunda-feira, 27 de maio de 2013

REBELDES COM CAUSA: THE CLASH (DISCOGRAFIA + SHOWS COMPLETOS + DOCUMENTÁRIO "WESTWAY TO THE WORLD")

 

Em homenagem a uma das mais fodásticas bandas inglesas da história do punk-rock, aí vai um pacotão THE CLASH. Inclui: discografia completa (pra ouvir on-line ou baixar), um punhado de shows inteiros pra ver no Youtube e o documentário "Westway to the World", na íntegra e legendado em português (de cabo a rabo!). Siga viagem... 

The Sex Pistols may have been the first British punk rock band, but the Clash were the definitive British punk rockers. Where the Pistols were nihilistic, the Clash were fiery and idealistic, charged with righteousness and a leftist political ideology. From the outset, the band was more musically adventurous, expanding its hard rock & roll with reggae, dub, and rockabilly among other roots musics. Furthermore, they were blessed with two exceptional songwriters in Joe Strummer and Mick Jones, each with a distinctive voice and style. The Clash copped heavily from classic outlaw imagery, positioning themselves as rebels with a cause. As a result, they won a passionately devoted following on both sides of the Atlantic. While they became rock & roll heroes in the U.K., second only to The Jam in terms of popularity, it took the Clash several years to break into the American market, and when they finally did in 1982, they imploded several months later. Though the Clash never became the superstars they always threatened to become, they restored passion and protest to rock & roll. For a while, they really did seem like "the only band that mattered." - Stephen Thomas Erlewine (AMG All Music Guide)

DISCOGRAFIA COMPLETA:

Ou baixe 12 CDs em um torrent
(MP3 de 192kps, 1 GB)

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 SHOWS COMPLETOS:
"Westway to the World", documentário completo sobre a história do The Clash, 
legendado em português (1h 20min)

domingo, 26 de maio de 2013

A Revolução Verde Em Marcha: reflexões sobre a Marcha da Maconha e o movimento global em prol da legalização da cannabis!


A REVOLUÇÃO VERDE EM MARCHA!

A luz verde marcha pelas cidades, desfila na frente de universidades e drogarias, de shoppings e prefeituras, de cara limpa e na maior paz, disseminando informação e consciência enquanto dança e canta ao som de Raul Seixas, O Rappa, Manu Chao, Planet Hemp... É a luz verde que acende-se nos corações para peitar o farol vermelho todo manchado de sangue! Fervilhando pelas ruas, vão os dionisíacos maconheiros, demandando com uma mescla de revolta indignada e triunfante festa: 

"Dilma! Rousseff! Legaliza o beck!"; "Se a erva legalizar, olê-olê-olá... eu vou plantar!"; "Fumo proibido: traficante agradecido!"... dentre outras pérolas do slogan genuinamente popular. Enquanto marcha o verde, a tensão está no ar, já que há forças inimigas que espreitam, com seus revólveres no coldre, seus cassetetes e bombas de gás que saltam tão fácil sobre o corpo dos "desordeiros", dos "inimigos da Lei e da Ordem"...

Alegremente, sabendo que não vale a pena brigar com os carrancudos com a mesma soturna rigidez que eles demonstram, manda a trupe herbácea o aviso pros "hômi-de-farda": "Ei, polícia, maconha é uma delícia!". É um meio de dizer, através do humor e da provocação, que afinal de contas maconha não é nenhum bicho de sete cabeças - e pode até mesmo, se legalizada e tratada sem histeria, ser uma dispensadora de amplos benefícios, uma dádiva da Terra para nossas mentes...

Hoje em dia um movimento internacional vem colorindo de verde as ruas para escancarar o absurdo desperdício - de dinheiro público e de vidas humanas - acarretado pela Guerra às Drogas, em especial a estupidez descomunal da guerra empreendida contra a maconha, ou melhor, contra as pessoas que a plantam, a comercializam e a consomem. "Adivinha, Doutor, quem tá de volta na praça?" A esquadrilha da fumaça! Mas não a fumaça de que gosta o capitalismo - a fumaça das indústrias que vomitam seus poluentes na atmosfera e das armas de guerra a lançar seus mísseis e a provocar seus incêndios mortíferos que queimam civis e crianças... - mas a fumaça que deixa a "mente ativa" e que, para usar a expressão do B Negão, "passa de mono pra estéreo a tua compreensão"...


Em Goiânia, a Marcha Maconheira 2013 foi linda, excitante, barulhenta, diversificada... (Veja o vídeo) Pelo menos 2.000 pessoas estavam lá para o rolê que, saindo da Praça Universitária, atravessou a Rua 10 e encheu de verde a Praça Cívica iluminada por uma Lua cheíssima. A "causa" cannábica foi conectada com muitas outras: a feminista (hoje em dia bombando com a "Marcha das Vadias"...), a causa do Estado laico (hoje em dia ameaçadíssimo por Feliânus e Malafaias, dentre outros salafrários...), a causa anti-manicomial (hoje em dia na crista da onda com a instauração das "internações compulsórias para usuários de crack"...). 

Além disso, os problemas locais não foram negligenciados e a Marcha da Maconha Goiânia 2013 pôde dar seu recado sobre muitos temas de relevância para o goiano: o aumento abusivo das tarifas do transporte público; as alterações no Plano Diretor que ameaçam destruir o meio ambiente em prol do grande trator do capital corporativo; o governo todo roído por vermes de Marconi Perillo, tucano cachoeirista que, no ano passado, quando reveladas as tramóias em que se meteu, viu a juventude sair às ruas em consideráveis marchas "Fora Marconi" - algumas delas com mais de 5 mil participantes...

Debaixo de uma Lua cheia que não conhece nenhuma lei humana, que segue em sua órbita em total desprezo por quaisquer ditames, A.I.s ou dogmas que humanos tentem lhe impor, Goiânia marchou em prol de leis mais sábias. E marchou de cabeça erguida, com muita gente já convicta de que a vitória não tarda e que não há Lei neste mundo que vá impedir esta erva de prosseguir brotando por mil recantos deste planeta...

Contra o machismo que estupra e mata, contra os pastores fanáticos que só sabem condenar os "comportamentos desviantes", contra os militares broncos que querem resolver tudo no tiro, contra os vendedores de drogas bem mais perigosas do que a erva, e que se interessam mais por seu lucro do que pela saúde de um povo... Contra esses, marchamos! Em prol de um mundo mais verde, com menos motosserras e hiper-mercados, onde cada um tenha o direito de consumir - não as geringonças e quinquilharias que o capitalismo põe no mercado... - mas aquilo que cada um sente lhe ajudar a melhor "vislumbrar o infinito" e melhor perceber-se como parte do todo, capaz de conexão e soma.



Marcha das Vadias, São Paulo, Maio de 2013. Veja mais fotos.
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A Marcha da Maconha brasileira, ano-a-ano, tem insistido em tentar convencer a opinião pública brasileira do fracasso absoluto da atual política pública em relação às drogas, um tema que já foi muito bem exposto por ótimos filmes como "Cortina de Fumaça""Quebrando o Tabu""Notícias de uma Guerra Particular""Dançando com o Demônio", "Grass" - pra ficar só nos documentários.

O proibicionismo é uma política surgida nos EUA no século XX e que, pela primeira vez na história, pôs fora-da-lei a produção, a venda e o consumo de uma planta que havia sido perfeitamente legal por mais de 30 séculos - ou melhor, que nunca antes havia sido estigmatizada, demonizada outlawed. 

Por um lado, o proibicionismo yankee fede à xenofobia e preconceito racial: a marijuana era a substância de predileção dos negros, dos mexicanos, dos porto-riquenhos, e criminalizá-la era um meio de controle destas populações empobrecidas e exploradas, quase um pretexto para encarcerar aqueles que, pela cor de sua pele, seu sotaque excêntrico ou seu estranho local de origem eram considerados como elementos potencialmente perigosos.

Além disso, sabe-se do papel das grandes corporações do ramo da indústria têxtil em prol da criminalização do cânhamo, já que a fibra do hemp é muito melhor do que algodão e nylon e sua legalização acarretaria uma catástrofe para os lucros destas empresas. Tanto que William Randolph Hearst, o cidadão Kane, magnata da mídia e ultra-capitalista egocêntrico, tratou de caluniar e denegrir a imagem da maconha na opinião pública tendo em vista seus mesquinhos interesses pecuniários. Cuzão!

A cada dia se torna mais claro que o proibicionismo só serve aos interesses sórdidos daqueles que estão no negócio do encarceramento em massa de cidadãos; só serve às empresas do ramo de bebidas e de cigarro, cujo produto gera mais morte e mais doença em 1 ano do que a maconha causou em 3 milênios, e que perderiam largas fatias de lucro caso a maconha fosse legalizada; que o proibicionismo é amigo dos mega-traficantes e dos trustes do narcotráfico, com tudo o que isso acarreta de policiais, políticos e juízes aceitando propinas e vendendo favores; e, é claro, o proibicionismo é resquício de uma mentalidade ditatorial e militarzóide, que tem como ideal uma política onde mandam militares broncos que pensam poder resolver qualquer problema na bala, e que desejam se fazer necessários ao perpetuar as guerras... E, last but not least, a política proibicionista só agrada aos membros do governo, do empresariado e da mídia que desejam nossas mentes cativas, manipuláveis, encharcadas de besteirol, governáveis, eles que tem tudo a perder com a expansão da consciência coletiva que a legalização da cannabis poderia acarretar...

Marcha da Maconha em Brasília, 2012. Veja o álbum de fotos com várias marchas, incluindo Rio, Sampa, B.H., Goiânia, Salvador, Porto Alegre, dentre outras cidades...


A Marcha da Maconha convida jovialmente os proibicionistas, os repressores radicais que desejam "exterminar" estes viciosos sem-vergonhas e moralmente corruptos que são os maconheiros: em lugar de tanta bala, tanta cadeia e tanta repressão, porque não pensar em leis mais sábias? Aliás, é suspeita antiga minha que a grande maioria dos proibicionistas nunca fumou um beck, ou ao menos não tragou, o que merece uma paráfrase da excelente idéia de Terence McKenna (originalmente sobre o LSD): "A maconha é uma substância capaz de produzir efeitos psicóticos e paranóicos intensos naqueles que não a utilizaram."

Afinal, seriam da mesma opinião os senhores proibicionistas se tivessem de fato experimentado  e pesquisado concretamente os efeitos da substância? Não seria mais interessante, ao invés da perseguição belicista, uma atitude mais curiosa e inquiritiva, ou seja, fazer pesquisas científicas sérias, com pesquisadores e intelectuais bem pagos, sobre os potenciais benéficos e possíveis perigos desta planta? Por que não deixar os psicólogos, os antropólogos, os filósofos, os juristas, opinarem sobre a melhor maneira de lidar politicamente com uma erva tão amplamente utilizada e tão entusiasticamente aclamada por seus usuários? Por que não dar uma chance para um novo ciclo vegetal iniciar sua jornada legal sobre solo brasileiro, e por que não considerar a hipótese de que ele possa ser um dos pilares de uma sociedade menos nefasta, opressora e hierarquizada do que aquelas que se ergueram sobre o açúcar, o café e a pecuária?

"Se as palavras vida, liberdade e procura da felicidade não incluem o direito de experimentar com a própria consciência, então a Declaração de Independência não vale o cânhamo onde foi escrita." - Terence McKenna

O cânhamo, muito provavelmente, é a autêntica "planta do futuro": e quem não acordar pra isso vai ficar sendo parte do passado. O vasto leque de utilidades do cânhamo - que pode ser usado para fazer papel, roupa, combustível, remédio... - é sinal do quanto a estupidez do proibicionismo está nos privando de uma planta prodigiosamente benéfica em muitos domínios além da expansão da consciência e da "recreação" psicodélica. Quando a Era do Petróleo acabar (deste século não passa...), talvez a revolução verde agora em marcha torne-se não somente altamente desejável, mas absolutamente necessária. O tempo dirá! 

O Tempo, afinal de contas, já é velho conhecido e comparsa do cânhamo: eis uma planta que atravessou os milênios, não só sobrevivendo muito bem a todas as intempéries e desmatamentos, como também prestando múltiplos serviços aos humanos. O cânhamo está profundamente enraizado no passado humano, tendo participado ativamente da Invenção da Imprensa de Gutemberg e das Grandes Navegações pelas quais os europeus invadiram e pilharam a América; foi coadjuvante da Declaração de Independência dos Estados Unidos da América (que foi escrita em papel de cânhamo1), tendo sido cultivado em imensas fazendas por yankees de bufunfa grossa, chegando a ser um dos produtos agrícolas mais importantes do país, pau-a-pau com o milho e o algodão; sem falar que remédios derivados do cânhamo já foram onipresentes nas farmácias, sendo usados até pela Rainha da Inglaterra para minorar os efeitos de suas cólicas menstruais...

Além disso, mundo afora, e mais particularmente no Oriente, o cânhamo foi sacralizado por muitas culturas, consagrado em evangelhos, poemas e canções, tendo sido muito provavelmente um dos elementos importantes para a emergência histórica de vários cultos e religiões xamânicas, hinduístas, budistas, rastafaris, umbandísticas...


São milênios de usufruto e apenas décadas de repressão. Sagrada em muitas civilizações, a cannabis foi parte importante da nossa história, marcando ramos diversos da condição humana: a religião e o misticismo (ela é sagrada para os hindus da Índia, por exemplo, que em sua mitologia transformaram a maconha numa dádiva feita pelo deus Shiva à humanidade...); a criação artística e filosófica (quantas obras e quantas descobertas não foram auxiliadas pelas alterações de consciência desencadeadas pelo THC no cérebro humano?); a farmacologia e a medicina (a cannabis consta entre os remédios mais antigos e mais eficazes que o homo sapiens descobriu no imensamente bio-diverso reino da phýsis...). 

Mundo afora, este último aspecto - o potencial benéfico ou terapêutico da maconha - ganha progressiva credibilidade e comprovação científica. E em muitos países os benefícios da cannabis medicinal já podem ser usufruídos por milhões de pessoas que sofrem de AIDS, câncer, depressão, glaucoma ou dúzias de outras condições sobre as quais a maconha age de modo benéfico, por exemplo minorando os efeitos adversos da quimioterapia ou reabrindo um apetite de leão (vulgo "larica") naqueles fragilizados pela doença. Estados norte-americanos de peso, como Califórnia e Washington, e países inteiros, como a Holanda e o Uruguai sob a presidência de Mujica, já deram este passo à frente.

Quanto ao uso dito "recreativo", a maconha é a substância ilícita mais usada no planeta, a mais popular e a mais universal, e não cessa de espantar a bizarra situação histórica em que nos encontramos: apesar dos milhões de mortos, nas últimas décadas, por causa do cigarro e do álcool, estas substâncias são de comércio legal e protegidas por mega-corporações e governos a elas favoráveis, enquanto que a maconha, que jamais na história registrada causou uma única morte por overdose, prossegue ilegal - seu usuário criminalizado, seu plantio proscrito, sua comercialização reprimida, seus comerciantes encarcerados... 

A Guerra às Drogas não chegou nem perto de exterminar as substâncias alteradoras da percepção, mas conseguiu exterminar... pessoas: nos campos de batalha do Rio de Janeiro e de Bogotá, de Lima e da Cidade do México, os corpos sem vida de traficantes e policiais não cessam de cair. E não há de cessar tão cedo a sanguinolência e violência nos clashes entre as Cidades de Deus e os Caveirões da s Tropas-de-Elite caso a política proibicionista hoje em vigor prossiga. Com o proibicionismo, caminhamos para a catástrofe: penitenciárias super-lotadas, com condições de vida abomináveis, onde centenas de milhares de pessoas são trancafiadas não para qualquer tipo de "reeducação moral", mas sim para serem apresentadas a uma das facetas mais sórdidas e fascistas deste Sistema. Com a continuação da política proibicionista, o Brasil pode esperar novos Carandirus, novas Candelárias, novos escândalos para manchar nossa imagem e nossa história com seu sangue jorrante... 

E pra falar no dialeto "economiquês" tão apreciado pelos políticos que nos impõe o proibicionismo, eis um fato simples: é absurdo querer guerrear contra produtos cuja demanda, por parte da população, é gigante. Quando há uma demanda tão vasta, é óbvio que haverá uma oferta para supri-la. No excelente filme The Union - O Negócio Por Trás do Barato, o espectador conhece o gigantismo deste mercado e o quão irrealizável é o projeto de alguns proibicionistas radicais de aniquilá-lo por inteiro. Em outros termos: em um país como o nosso, onde pelo menos umas 5 milhões de pessoas (chutando muito baixo!) desejam consumir maconha, é absolutamente ridículo pretender extinguir este mercado a força de bala e de cadeia.

A demanda das massas pela maconha não cessou durante as décadas de brutalidade policial e ferocidade carcerária, mas, pelo contrário, só tendeu a se fortalecer e se disseminar. Imaginem um governo que tentasse banir de seu território o comércio de café, e que para isso lançasse na cadeia todas as pessoas que fossem pegas em flagrante delito de traficar café. Em breve não haveria mais lugar algum para novos presos. É o que dá quando se proíbe e criminaliza um comportamento amplamente disseminado, a despeito das leis, e quando se quer criminalizar algo que as pessoas continuarão comprando de qualquer jeito, mesmo que tenham que recorrer ao mercado clandestino.

 A Lei Seca americana, que quis proibir o álcool, foi um retumbante fracasso que gerou como subprodutos um mercado negro enorme e a proliferação de Al Capones e violências sanguinolentas mil. A História mostra a ineficácia de um sistema que lança na cadeia as pessoas quando estão comercializando produtos que elas desejam intensamente "consumir" e cujos benefícios desejam gozar. O proibicionismo está fadado ao fracasso recorrente pois ele se choca contra a vontade de milhões. E uma vontade coletiva, aliás, cada dia mais tenaz e organizada, cada dia mais triunfante e de cabeça erguida, cada dia reivindicando mais alto, nas ruas, um outro mundo possível. E onde haja mais luz verde!


quinta-feira, 23 de maio de 2013

"...a América que será protegida por uma enorme força militar não será a América do povo, mas aquela dos privilegiados; da classe que rouba e explora as massas e controla a sua vida, do berço ao túmulo." (Emma Goldman)




A MORTÍFERA LOUCURA DO BELICISMO
Texto de Emma Goldman (1869-1940)
Em "O indivíduo, a sociedade e o Estado"
(Ed. Hedra. Série Estudos Libertários.
Trad. Plínio Augusto Coelho.)


“Desprezo, arrogância e egoísmo são os três elementos fundamentais do patriotismo. Segundo a teoria do patriotismo, nosso globo seria dividido em pequenos territórios, cada um cercado por uma cerca metálica. Aqueles que têm a oportunidade de ter nascido em um território particular consideram-se mais virtuosos, mais nobres, maiores, mais inteligentes do que os que povoam outros países. É, pois, dever de todo habitante desse território lutar, matar e morrer para tentar impor sua superioridade a todos os outros. Os ocupantes dos outros territórios raciocinam do mesmo modo, evidentemente. Resultado: desde os seus primeiros anos, o espírito da criança é envenenado por autênticos relatos de terror concernentes aos alemães, franceses, italianos, russos etc. Quando a criança atinge a idade adulta, seu cérebro está completamente intoxicado…

“Necessitamos de um exército permanente para proteger o país contra uma invasão estrangeira”, afirmam nossos governantes. Todo homem e toda mulher inteligentes sabem, contudo, que se trata de um mito destinado a apavorar as pessoas crédulas e obrigá-las a obedecer. Como disse Carlyle, “a guerra é uma querela entre dois ladrões demasiado covardes para produzir seu próprio combate; é por isso que eles escolhem jovens egressos de vilarejos diferentes, põe-lhes um uniforme, dão-lhes um fuzil e soltam-nos como animais selvagens para que eles se entredestruam.”

Os norte-americanos dizem amar a paz. Parece que detestam verter sangue, que se opõem à violência. E, contudo, pulam de júbilo quando aprendem que máquinas voadoras poderão lançar bombas recheadas de dinamite sobre cidadãos sem defesa. Estão prontos a enforcar, eletrocutar ou linchar toda pessoa que, levada pela necessidade econômica, arriscar sua própria vida atentando contra a vida de um magnata industrial. Os corações inflam de orgulho ao pensar que a América se tornará a nação mais poderosa da Terra e que esmagará com suas botas as outras nações…

Ilustração do cartunista sírio Fahd Bahady

Toda a nossa civilização, toda a nossa cultura está concentrada na louca demanda de armas de destruição, se possível as mais aperfeiçoadas. "Munições! Munições! Ó Senhor, tu que reinas sobre a terra e os céus, tu, ó Deus do amor, da piedade e da justiça, concede-nos bastante munição para destruir nosso inimigo!" Tal é a oração que ascende ao céu cristão todos os dias.

Nos EUA, os chauvinistas e os especuladores belicistas não param de tartamudear slogans sentimentalistas de nacionalismo hipócrita: “A América de início, antes de tudo e sempre.” Milhões e milhões de dólares arrancados do suor e do sangue do povo serão gastos na compra de encouraçados e submarinos para o exército e a marinha, e isso tudo para proteger essa preciosa América. 

Esses discursos repletos de pathos dissimulam o fato de que a América que será protegida por uma enorme força militar não será a América do povo, mas aquela dos privilegiados; da classe que rouba e explora as massas e controla a sua vida, do berço ao túmulo. É patético que tão poucas pessoas deem-se conta de que a preparação militar nunca conduz à paz, mas leva direto ao massacre universal.

Durante a 1ª Guerra Mundial, a América enriqueceu-se fabricando toneladas de munições e emprestando dinheiro aos Aliados para ajudá-los a esmagar os prussianos. (…) Em nenhum lugar do mundo o capitalismo é tão desavergonhadamente ávido quando nos Estados Unidos, e em nenhum lugar o Estado está tão disposto a ajoelhar-se aos pés do capital.

Defender as instituições deste país (os EUA) é defender as instituições que protegem e apoiam um punhado de indivíduos para que eles roubem e pilhem as massas; instituições que sugam o sangue dos autóctones tanto quanto dos estrangeiros, e transformam-no em riquezas e poder; instituições que despojam cada imigrado da cultura original que levou consigo e impõem-lhe, em troca, esse americanismo barato, cuja única glória é a mediocridade e a arrogância.

Não se pode impor o militarismo a homens livres. É preciso ter à sua disposição escravos, autômatos, máquinas, criaturas obedientes e disciplinadas, que se deslocarão, agirão, matarão e dispararão sob as ordens de seus superiores. Eis em que resultará a preparação militar; nada além disso.

A preparação militar é como o grão de uma planta venenosa: uma vez plantada na terra, ela dará frutos envenenados. As massas europeias que combatiam nas trincheiras e nos campos de batalha não eram motivadas por um desejo profundo de fazer a guerra: o que as levou a ela foi a competição impiedosa entre ínfimas minorias de aproveitadores zelosos em desenvolver os equipamentos militares, exércitos mais eficazes, navios de guerra maiores, canhões de longo alcance…

O militarismo destrói os elementos mais sadios e mais produtivos de cada nação. Desperdiça a maior parte da renda nacional. O Estado não despende quase nada para o ensino, a arte, a literatura e a ciência em comparação com as somas consideráveis que consagra ao armamento. E é o suor e o sangue das massas que servem para nutrir o monstro insaciável do militarismo.

Ele se torna cada vez mais arrogante, agressivo, imbuído de sua importância. Para permanecer vivo, o militarismo necessita constantemente de energia suplementar; eis porque ele buscará sempre um inimigo ou, em sua ausência, criará um artificialmente. Ele só pode viver graças ao assassinato. 

A preparação militar encoraja a criação de grupos de interesses, que trabalham consciente e deliberadamente para aumentar a produção de armamentos e manter uma histeria belicista. Esse lobby inclui todos aqueles que estão engajados na fabricação e na venda de munições e equipamentos miliares com vistas a acumular ganhos e benefícios pessoais. Este truste incita à guerra para embolsar milhões de lucro no âmbito desse terrível mercado.

Não basta dizer-se neutro. Tal neutralidade é uma fraude, que só serve para cobrir com um véu hipócrita os crimes de outros países. Devemos denunciar os falsos valores, as instituições malfazejas e todas as atrocidades cometidas pela sociedade burguesa. Aqueles que estão conscientes da necessidade vital de participar de grandes lutas devem opor-se à preparação militar imposta pelo Estado e pelo capitalismo para a destruição das massas. Eles devem incitar as massas a derrubar simultaneamente o capitalismo e o Estado.”

"Se eu não posso dançar, não é minha revolução!"
(Emma Goldman)
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SIGA VIAGEM…
 
"Emma Gooldman: Uma mulher excessivamente perigosa"

Documentário completo e legendado em espanhol; produzido pela PBS em 2004 para a série American Experience; 1h25min; site oficial do filme.

terça-feira, 21 de maio de 2013

#Discografias Completas! [#02] JANIS JOPLIN


JANIS JOPLIN
(8 álbuns, 192 kps, 675 mb)

"The greatest white female rock singer of the 1960s, Janis Joplin was also a great blues singer, making her material her own with her wailing, raspy, supercharged emotional delivery. First rising to stardom as the frontwoman for San Francisco psychedelic band Big Brother & the Holding Company, she left the group in the late '60s for a brief and uneven (though commercially successful) career as a solo artist. Although she wasn't always supplied with the best material or most sympathetic musicians, her best recordings, with both Big Brother and on her own, are some of the most exciting performances of her era. She also did much to redefine the role of women in rock with her assertive, sexually forthright persona and raunchy, electrifying on-stage presence..." - Continue lendo @ AMG a Biografia e Discografia da Janis)
#Ouça on-line (álbuns completos) ou faça o download:
#Janis em Filme…
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Capa por Robert Crumb

"...o perspectivismo ameríndio começa pela afirmação: 'o outro existe, logo pensa'..." (Viveiros de Castro)


Palavras do brilhante antropólogo brasileiro Eduardo Viveiros de Castro
"Se Descartes nos ensinou, a nós modernos, a dizer 'eu penso, logo existo' - a dizer, portanto, que a única vida ou existência que consigo pensar como indubitável é a minha própria -, o perspectivismo ameríndio começa pela afirmação duplamente inversa: 'o outro existe, logo pensa'. E se esse que existe é outro, então seu pensamento é necessariamente outro que o meu. Quem sabe até deva concluir que, se penso, então também sou um outro. Pois só o outro pensa, só é interessante o pensamento enquanto potência de alteridade. O que seria uma boa definição da antropologia. E também uma boa definição da antropofagia, no sentido que este termo recebeu em certo alto momento do pensamento brasileiro, aquele representado pela genial e enigmática figura de Oswald de Andrade: 'Só me interessa o que não é meu. Lei do homem. Lei do antropófago.' Lei do antropólogo." VIVEIROS DE CASTRO. Encontros. Azougue Editorial, 254 pgs, R$29,90. Compre o livro na Livraria Cultura.Saiba mais.
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Abaixo, assista à palestra "A Morte Como Ritual", 
no Café Filosófico da TV Cultura, na íntegra (46 min): 

#Discografias Completas! [#01] JIMI HENDRIX



#Discografias! [#01]
JIMI HENDRIX
(Seattle 1942 - Londres 1970)

Baixar discografia básica (600 MEGA)
ou completa (com 19 álbuns - 2.60 GB).

TOP 5:


  • ARE YOU EXPERIENCED? (1967)
  • AXIS: BOLD AS LOVE (1967)
  • ELECTRIC LADYLAND (1968)
  • BAND OF GYPSYS (1970)
  • BLUES (coletânea, 1996)


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Brasileirada! (Coletânea de Música Brazuca - 14ª Edição...)

Um rolê sonoro multifacetado pela música brasileira de várias eras: a cyber-fitinha começa com Rita Lee & Tutti Frutti (bandaça pós-Mutantes de Lovely Rita, aquela que dá de 10 na Ritalina!). Depois a K7-do-cacete segue adiante com Apanhador Só (em uma das mais joviais cantigas do disco de estréia dos gaúchos…), pega uma carona num Funk Como Le Gusta, passa por novos talentos da música indie brasileira (Maglore, Far From Alaska...) e vai embora… Suba o volume, aperte play e boa viagem!

01) RITA LEE & TUTTI FRUTTI, “Pirataria”
02) APANHADOR SÓ, “Vila do Meio Dia”
 03) FUNK COMO LE GUSTA, “Motéis”
04) MAGLORE, “Tão Além”
05) FAR FROM ALASKA, “Mama”
06) CASA DAS MÁQUINAS, “Cantem Esse Som Com a Gente”
07) CAMISA DE VÊNUS, “Eu Não Matei Joana D’arc”
08) THEE BUTCHERS ORCHESTRA, “Got Me In a Hook”
09) PROT(O) - “Encarando a Face do Mal”
10) GRAVEOLA & O LIXO POLIFÔNICO, “Babulina’s Trip”
11) WALDI & REDSON, “Trêta Timbrêra”
12) CÉU, “10 Contados”.

terça-feira, 14 de maio de 2013

Chegou o 15º Festival Bananada!!! (Em Goiânia, de 13 a 19 de Maio...)


É, macacada: nos próximos dias, em Goiânia, não vai faltar banana! A 15ª edição anual consecutiva do festival Bananada, patrocinado pela Petrobrás e produzido pela Construtora, traz uma semana de intensa efervescência cultural à capital goiana. Vão rolar cerca de 50 shows, incluindo duas atrações internacionais: Brendan Bendon (comparsa de Jack White no The Racounteurs e um dos mais talentosos cantores-compositores de power-pop e indie-rock melódico da atualidade) e o stoner-rock apunkalhado do Mondo Generator (banda do carequinha porralouca Nick Oliveri, ex-Queens of The Stone Age, famoso por ter ido em cana ao tocar peladão em uma de suas passagens pelo Brasil).

Dentre as atrações nacionais, muitos destaques, dentre os quais: o grunge gaúcho dos Walverdes, a estrondosa guitarrice garageira do Amp, a florida MPB da Tulipa, a festança ska esfuziante do Fusile (que já encantou o público de Goiânia em uma edição do Vaca Amarela), a orquestra guitarrística dos Camarones, a espetacular revelação do rock de Natal Far From Alaska - banda que mereceu uma matéria só dela lá no site dos trutas, A Gambiarra. Além disso, o cenário de Goiânia Rock City vai poder mostrar toda sua diversidade e força com shows de algumas das principais bandas da cidade: Black Drawing Chalks, Cambriana, Hellbenders, MQN, Johnny Suxxx, Cherry Devil, Gloom, Rollin' Chamas, Aurora Rules, Dry... e por aí vai!

Além disso, vai rolar festival de gastronomia, exposição de arte, debates e palestras (UnConvention). "Tudo isso no já consagrado formato “Quanto Vale o Show?”, no qual o público paga o valor que acha justo para ver os shows, entre 5 e 100 reais." Acesse o site oficial e confira a programação completa.

Brendan Benson, atração internacional do Bananada 2013

The Raconteurs, banda que Brendan Benson integrou junto com Jack White: 
confira um show completo.


PRINCIPAIS ATRAÇÕES - BANANADA 2013


14 DE MAIO (TERÇA-FEIRA)

Centro Cultura UFG (Praça Universitária)
19h30 – BRUNA MENDEZ
20h15 – GLOOM
21h00 – TULIPA RUIZ

16 DE MAIO (QUINTA-FEIRA)
Diablo Pub
00h – OVERFUZZ
01h – AMP
Toda a noite: MARCELLE VAZ (dj set)

17 DE MAIO (SEXTA-FEIRA)

Centro Cultural Oscar Niemeyer
18h – NUVENS INVISÍVEIS (Palco Esplanada)
18h30 – DRY (Palácio da Música)
19h – CHERRY DEVIL (Palco Esplanada)
19h30 – DI BIGODE (Palácio da Música)
20h10 – UH LA LÁ! (Palco Esplanada)
20h50 – FAR FROM LASKA (Palácio da Música)
21h30 – MQN (Palco Esplanada)
22h10 – WALVERDES (Palácio da Música)
23h15 – BLACK DRAWING CHALKS (Palácio da Música)
00h30 – MONDO GENERATOR (Palácio da Música)
Pista Ambiente: PABLO KOSSA (dj set) / FRANÇOIS CALIL (dj set)

18 DE MAIO (SÁBADO)

Centro Cultural Oscar Niemeyer
18h – BOOGARINS (palco esplanada)
18h30 – VALENTINA (palácio da música)
19h – JOHNNY SUXXX AND THE FUCKIN' BOYS (palco esplanada)
19h30 – MEDIALUNAS (palácio da música)
20h10 – SINGLE PARENTS (palco esplanada)
20h50 – CAMARONES ORQUESTRA GUITARRÍSTICA (palácio da música)
21h30 – ROLLIN' CHAMAS (palco esplanada)
22h10 – FUSILE (palácio da música)
23h15 – CAMBRIANA (palácio da música)
00h30 – BRENDAN BENSON (palácio da música)
Pista Ambiente: LUCAS MANGA (dj set) / FREDY Xistecê (dj set)

19 DE MAIO (DOMINGO)

Centro Cultural Oscar Niemeyer
17h – AURORA RULES
17h50 – GIRLIE HELL
18h40 – KAMURA
19h30 – ELMA
20h20 – MUGO
21h10 – HELLBENDERS
Pista Ambiente: RENATÃO (dj set) / ROBSÃO (dj set)


Programação completa: http://festivalbananada.com/









domingo, 12 de maio de 2013

GRASSHOPPER NIGHT: O show de Paul McCartney em Goiânia...



GRASSHOPPER NIGHT
Uma Gonzo-Reportagem


"...a imperecível necessidade humana de viver em beleza." 
Johan Huizinga em "Homo Ludens"
(Ed. Perspectiva, pg. 71)




"Remember to let her into your heart, 
Then you can start to make it better
The minute you let her under your skin,
Then you begin to make it better.
So let it out and let it in...
Hey Jude, begin!
Don't carry the world upon your shoulders..."





Paul McCartney teve que percorrer uma longa e tortuosa estrada até vir parar, com mais de 70 anos rodados pelas trilhas da vida, aqui nas terras dos Goyazes... 

Em sua primeira infância, na Inglaterra de 1942, durante a 2ª Guerra Mundial, o garoto de Liverpool brincava pelos territórios bombardeados pelo III Reich, como ele mesmo narra no início do Beatles Anthology: "We played on bomb-sites a lot and I grew up thinking the word 'bomb-site' almost meant 'playground'. Reminders of the war were all around..." (p. 17). 

Foi por pouco que Hitler e sua gangue de arianos genocidas não adicionaram ao seu horrendo catálogo de atrocidades a morte da família McCartney: estima-se que 4.000 pessoas morreram durante os ataques da Luftwaffe que ficaram conhecidos como Liverpool Blitz.


Filho de um pai protestante que tocava piano, e que desde o berço fez o pequeno Paul "mergulhar" no mundo do jazz e do folk, e de uma enfermeira católica, que sempre cuidou de sua saúde com muito esmero, McCartney desde cedo esteve rodeado e possuído pelas musas da música. 

Desde tenra idade, decorava os hits do rádio, tocava piano em festinhas familiares, compunha cantigas ao violão e ia atrás de conhecer e se amigar com os melhores músicos de Liverpool: antes dos 16 anos de idade, já impressionava os músicos ao seu redor com suas versões bem-timbradíssimas de Eddie Cochran, Little Richard e Elvis Presley, dentre outros roqueiros das antigas. E logo o mocinho integraria a Banda de Besouros, a Banda do Sargento Pimento e do Submarino Amarelo, aquela que se tornaria um dos monumentos musicais mais importantes do século 20 e uma das cerejas no bolo do Sonho Hippie...

E hoje em dia, me parece, McCartney prossegue, apesar de ser um perfeito gentleman britânico, um hippão de coração. Talvez o hippie, neste planeta, com a maior conta bancária (sua fortuna é estimada em mais de U$1.000.000... um bilhão de doletas!), e cujo ideário hippie decerto não inclui como ideal norteante a pobreza voluntária. McCartney ainda fala em favor da legalização da maconha, que, conta a lenda, teria sido apresentado aos Beatles em 1964 por Bob Dylan, o que parece ter sido para Paul o início de um caso de amor de fidelidade ímpar, com o cânhamo sagrado, já que ele segue pró-cannabis mesmo tendo sido preso algumas vezes, em alguns países, por posse de fontes de THC. McCartney também ilita em prol dos direitos animais,  sendo talvez o vegan com maior apelo de massas no atual showbizz global, capacitado para gerar discussão e debate público sobre um tema ainda tabu (os bilhões de criaturas mortas para serem consumidas por humanos na forma de hambúrgueres, salsichas e fatias de bacon)

Outro índice de hippiedade é que em  muitas ocasiões ele já escancarou, em suas declarações, uma mui-hippie predileção intensa pela psicodelia. Teve uma experiência existencial significativa quando olhou através dos telescópios e microscópicos lisérgicos, nos anos 60, época em que ingeriu muitas doses da Poção de Hoffmann que o Dr. Leary andava louvando por aí (o LSD... homenageado singelamente em "Lucy in the Sky With Diamonds", dentre outras cantigas). Os pendores de Paul McCartney ao louvor arrebatado e hiperbólico às substâncias psicodélicas ficam claros, por exemplo, em declarações como a seguinte, que foi pescada do Anthology e em que ele relata sua experiência com  o LSD:


"After I took LSD, it opened my eyes: we only use one-tenth of our brain. Just think what we could all accomplish if we could only tap that hidden part. It would mean a whole new world. If the politicians would take LSD, there wouldn’t be any more war or poverty or famine."

McCARTNEY
No "The Beatles Anthology"
(Chronicle Books, San Francisco, Pg. 255)
[ Re-blogar citação no Tumblr ]

McCartney, hoje em dia? Um setentão que aguenta 3 horas de show sem precisar beber uma gota d'água. E esta turnê pelo Brasil, em 2013, certamente deixará lembranças indeléveis nos corações e mentes dos cerca de 150.000 brasileiros que o viram de perto em Belo Horizonte (no Mineirão), Goiânia (no Serra Dourada) e em Fortaleza (no Canecão).




Foi uma oportunidade magnífica ver em carne-e-osso esse mito-vivo, em sua primeira aparição por Goiás, com um showzaço que satisfez com folga o público que encheu o Serra Dourada. Até agora não conversei com ninguém que não tenha descrito o espetáculo com os mais entusiásticos e gratos dos termos. Foram 38 músicas, com um repertório repleto de clássicos dos Beatles (com destaque para "Hey Jude", "Let It Be", "Eleanor Rigby", "Get Back", "Helter Skelter", "The Long and Winding Road", "Yesterday", "Back in the U.S.S.R"...) e dos Wings (incluindo as estupendas "Live and Let Die" e "Maybe I'm Amazed"). 

Num espetáculo grandioso, cheio de pirotecnias, com psicodelia bem-bolada rolando nos telões, e acompanhado por uma bandaça impecável, Paul McCartney passou por Goiânia impressionando geral com sua vivacidade, sua simpatia e seu embriagante e revigorante tônico musical, bebido com tanta sede e deleite pelas massas-em-festa... Em suma: reativando a beatlemania nestas noites brasileiras repletas de histerias ultra-admirativas e aclamações esfuziantes, Macca encantou geral com sua voz e suas melodias, dando farto alimento à "imperecível necessidade humana" (pois nem só de pão vive o homem...) "de viver em beleza" - como diz no Homo Ludens o Huizinga. 

"Goiânia Grasshopper Stage Invasion!" 
[Vídeo oficial do PaulMcCartney.com]

Sem dúvida, o elemento pitoresco do show em Goiânia, e que ficará indelével na memória do público e do músico, foi a alegre invasão daqueles beatlemaníacos alados que não perderam a chance de fazer o que muito mortal fica só passando vontade: tocar a carne de um mito. Viraram até notícia internacional! Goiânia fez jus a sua fama de "roça asfaltada" e, ao mesmo tempo, esta imprevista irrupção de vida fez com que o ambiente, saturado da artificialidade ultra-tecnológica daquele palco hi-techse reconectasse com a natureza. Como notório defensor dos direitos dos animais, Paul McCartney em nenhum momento foi agressivo contra os visitantes inesperados - aliás bastante inofensivos, desprovidos que são de malícia e de ferrão. Ao invés de enxotá-los com tapões ou piparotes que poderiam equivaler, para tão frágeis criaturas, a severos hematomas, ou mesmo a golpes fatais, McCartney divertiu-se como um pirralho com os bichinhos - dotados, aliás, de excelente gosto musical. 

Tem gente dizendo que eram grilos-esperança, outros que eram gafanhotos, outros ainda "insetos vetores"; pouco importa. O que importa é aquilo que o episódio revelou sobre a personalidade de Paul, seu espírito lúdico tão vivaz e seu senso-de-humor tão espontâneo. Também se tornou clara a capacidade enorme de empatia com outros terráqueos que é uma marca de personalidade de McCartney, que aliás criou uma das máximas mais célebres da história do vegetarianismo (que era também praticado por Linda): "se os abatedouros tivessem paredes de vidro, todos seriam vegetarianos". O estádio Serra Dourada foi proibido de vender espetinhos de carne no espaço do show, por pedido do próprio McCartney, que é militante pelos direitos animais há muitos anos. O que se escancarou com este episódio é que não é somente em prol de vacas, bois, galinhas, porcos e perus - dentre outros animais que os humanos devoram!  - que McCartney milita e defende. Que coerência genuína de pensamento e ação o episódio com os grasshoppers revelou! 

Pego de surpresa, McCartney mostrou excelente capacidade de improviso: usou o acaso a seu favor e transformou os bichos numa atração à parte. Um deles (ou seria uma delas?), particularmente obstinado em manter-se coladinho no Beatle, foi batizado de Harold e convidado a saudar a platéia no microfone. Mas Harold se intimidou diante dos mais de 45 mil humanos presentes e manteve-se calado. Quando veio o clássico "Hey Jude", um dos muitos ápices emocionais do show, com 40 mil vozes se juntando no coro de "nánáná", ocorreu um momento mágico: o grasshopper beatlemaníaco estava pousado nos ombros de McCartney quando veio o verso "The movement you need is on your shoulder", e Macca, veloz e sagaz, não perdeu a ocasião da alusão.

(Lembrei de uma das melhores cenas do documentário sobre Raul Seixas, O Início, o Fim e o Meioquando o diretor Walter Carvalho recebeu, também, um presente do acaso muito bem aproveitado: entrevistando Paulo Coelho em Genebra, cidade onde quase não existem moscas,  Carvalho viu o "set" ser invadido por uma inesperadíssima aparição alada; Paulo Coelho não perdeu a ocasião de apontar: "deve ser o Raul...". Depois de ser esmagada a mosca pelo místico higienista, a sacada do documentário, aliás brilhante, está edição de som, que faz com que Raulzito, eterno mosca-na-sopa da caretice e do quadradismo, entre cantando logo na sequência: "E nem adianta vir me dedetizar... Pois você mata uma e vem em outra em seu lugar!")



O que mais me assombra e me impressiona é uma pessoa com tamanha capacidade (intacta!) para as alegrias fáceis, para as cantorias vivazes, para as melodias memoráveis, quando sabemos quantas tragédias e lutos ele não teve que enfrentar nesta longa e tortuosa estrada da vida! Fora os horrores da guerra, experenciados na infância, que relatamos no começo desta gonzo trip, cabe lembrar que Paul, na adolescência, quando tinha 14 anos de idade, perdeu a mãe para o câncer - foi quando viu seu pai chorar pela primeira vez. Resistiu vivo através de outras tempestades, sobrevivendo ao assassinato que levou Lennon em 1980, ao câncer que matou sua esposa (e mãe de seus filhos) Linda em 1998, tendo também se despedido do caixão de George Harrison em 2001. É uma lição de vida testemunhar que nada disso aniquilou o senso de humor e a capacidade de empatia com os viventes deste artista com espírito perpétuo de menino e que encantou com sua graça os mais de 45 mil mortais que encheram o Serra Dourada para prestigiá-lo.



É bem verdade que este espetáculo Out There usa e abusa da pirotecnia, não economizando no tamanho dos telões, na coloridice extrema das imagens, na variedade de holofotes e luzes, na profusão de fogos de artifício e lançadores-de-chama (que fazem sua estrondosa aparição-clímax em "Live and Let Die"). Há algo de arrasa-quarteirão roliudiano no show, que pretende ser uma torrencial chuva de estímulos sensíveis sobre um público que McCartney deseja levar ao delírio, ao êxtase coletivo, depois recolhendo com deleite as aclamações, as salvas de palmas e os ursinhos de pelúcia lançados sobre o palco por mocinhas apaixonadas. 


Um crítico de arte que conhecesse de Adorno e Horkheimer, que soubesse das críticas de Guy Debord à "sociedade do espetáculo", talvez pudesse destroçar criticamente este show como mero showbusiness alienante, como uma criação do capitalismo hi-tech que serve para algo similar ao que o "Pão & Circo" fazia para o Império Romano. Acho plausível, aliás, que nosso governador tucano e cachoeirista, Marconi Perillo, tenha investido dinheiro público neste show com intenções de, através de uma pão-e-McCartney grandioso e crowd-pleaser, fazer com que os goianos esquecessem de suas tenebrosas e escusas relações com o Al Capone do Cerrado, o gangter Carlinhos Cachoeira, pra não falar do esquema de espionagem escancarado recentemente pela revista Carta Capital.


Só que, me parece, o show de McCartney jamais poderia ser reduzido a isso, um instrumento político na mão de um governo corrupto, pois é um evento cultural que transcende o presente: foi uma oportunidade de receber um "banho de imersão" na história da música pop inglesa em algumas de suas mais geniais criações nas últimas décadas, um embarque numa viagem que nos carrega de volta para os anos 60 e 70, que nos dá um vislumbre do que foi o frenesi da beatlemania, que nos deixa instigados a criar uma cultura cuja efervescência aspire a igualar aquela que incendiou o pop nos crazy sixties. 


McCartney escapa do "imediatismo" do showbizz, que costuma dar ao público algo que ele possa consumir e logo esquecer (a fila das mercadorias anda!). McCartney parece desejar que cada um no público leve para casa uma lembrança indelével, algo a ser carregado pelo resto da vida, por isso não se economiza, não poupa seu coração, não retêm seu sentimento; sentimos algo de genuinamente humano e caloroso sobressaindo sobre aquela parafernália técnica toda. McCartney anda fazendo, ao vivo, um ritual auto-celebratório em que resgata seus mais de 70 anos de vida e seus quase 50 anos de carreira, arrastando o público numa jornada colorida, lisérgica, psicodélica, às vezes kitsch, sempre emotiva e emocionada, por uma vida cuja criatividade e talento os milhões de beatlemaníacos não param de celebrar. 

Aliás, McCartney consegue muito bem, sem tecnologia pesada o acompanhando, encantar uma multidão com simplicidade e frugalidade: sozinho ao violão, quando canta "Blackbird" ou "Yesterday", não precisa de pirotecnia alguma para nos deixar encantados. Na homenagem à imortal canção de George Harrison, "Something", soube deixá-la graciosa em seu despojamento ao re-interpretá-la no ukelele.

Talvez tenha razão quem disse que a música é a única língua universal: Mozart ou Bach, tocados em qualquer latitude, em qualquer continente, independente do idioma que ali domine, são deleitáveis experiências para os tímpanos humanos; e "nánáná" em inglês, em japonês e em português é sempre "nánáná". Os sons, como anarquistas desrespeitadores de todos os arames farpados, não respeitam as fronteiras: caçoam delas, velejando no vento, voando por sobre os muros e atravessando as paredes. Talvez não haja nada, dentre as criações humanas, nada com mais benéfico potencial de congraçamento do que a música. Quando 50 mil pessoas houvem a mesma música, no mesmo espaço, quando suas vozes se unem para cantar uma melodia, podem sentir-se unidas em um sentimento como só deve ocorrer em raríssimas ocasiões e para raríssimas massas, quiçá só equiparável à fervura de um levante revolucionário... O mínimo que se pode dizer de Sir Paul McCartney é que ele tem uma capacidade de comunicação afetiva com as massas que é rara; que sua música prossegue tendo uma graça que transborda e que não envelhece; que com mais de 70 anos, prossegue com espírito de menino, legítimo espécimen do homo ludens; que muitas de suas melodias tem vocação para a eternidade e muito provavelmente poderão agradar também a nossos bisnetos e tataranetose que os Beatles não deixarão mais a história da música do século 20 como um de seus acontecimentos mais dourados. 

"And in the end
The love you take
Is equal to the love 
You make."


"Live and Let Die" e "Hey Jude"
(ao vivo em Goiânia, Maio de 2013)

Siga viagem em outras criações do Mega-Macaco Macca...


ÁLBUNS DE ESTÚDIO (COMPLETOS)

MCCARTNEY (1970)
MCCARTNEY II (1980) 
RUN DEVIL RUN (1999) 


ALGUMAS CANTIGAS MEMORÁVEIS

“WHEN I’M 64” DO SGT PEPPERS
“SHE’S LEAVING HOME” OUTRA DO SARGENTO PIMENTA

THE BEATLES ANTHOLOGY (ÁUDIO)
(6 horas de Beatles!)